FORMA É AFETO
09/02
Artistas: Andrea Brazil, Luciano Macedo, Mariana Guimarães
Curadoria: Shannon Botelho
FORMA É AFETO
Shannon Botelho
A afirmação, que parece não se sustentar, encontra um sentido muito preciso nesta exposição ao enredar as três pesquisas visuais que aqui se apresentam. Reunidos incialmente por uma afinidade formal, os trabalhos ordenam um sentido pouco explorado nas poéticas que flertam com a herança construtiva e seus desdobramentos. Entretanto, não desejamos convocar o programa concretista brasileiro, nem mesmo propor outras significações para as suas continuidades. Antes, desejamos ampliar os meios de acessar as obras que, pela forma, inevitavelmente atravessam o seu universo e constroem para si, outros modos de ordenar o espaço visual e as ideias através da noção de afeto. Por esta razão, Luciano Macedo – artista representado pela galeria – convida outras duas artistas, Andrea Brazil e Mariana Guimarães, cujos trabalhos selecionados partilham um mesmo conjunto de interesses.
Não se deve confundir afeto com passividade, nem com a primazia dos sentimentos sobre a razão. Como definiu Spinoza, afeto é o que move a alma, força capaz de gerar movimento, fluxo de vida e, consequentemente, interesse. Resulta desta força motriz, o que aqui podemos verificar, para além das formas geométricas presentes em todos os trabalhos que nascem de uma percepção aguçada do tempo, da vida cotidiana. Não são resultantes de simplificações formais ou de estruturações geométricas fechadas em si mesmas, antes exploram as diferentes aparições dessas formas na vida prosaica transmutando-as para a superfície das obras.
De um modo bastante peculiar, os trabalhos selecionados para esta exposição falam de vida. Nascidas em contextos distintos, todas resultam do dia a dia dos artistas, que observam a projeção das sombras nos espaços, as cores nos muros das cidades, os frisos dos carros, as fachadas dos prédios, a retidão geométrica dos cubinhos de legumes para uma sopa. Sim, pois, se aos trabalhos construtivos foi negada uma ligação com a vida, aqui afirmamos que a geometria que nos interessa é sensibilizada pela vida e que, sem este estado de afeição, ela não subsiste no mundo contemporâneo.
Assim como é a vida, repleta de caminhos não retilíneos, os trabalhos de Luciano Macedo espelham alegoricamente as possibilidades combinatórias da geometria sem perder o contato com o cotidiano. As formas dispostas em arranjos progressivos quase simétricos, trazem consigo em uma dimensão simbólica as escolhas que fazemos. O mesmo acontece nas obras de Andrea Brazil, onde as formas subtraídas de frames do cotidiano endossam as memórias e falam do tempo, do processo e de escolhas. Os bordados geométricos de Mariana Guimarães não são diferentes, pois apresentam uma pesquisa sobre o cuidado e intimidade. Sejam os arranjos visuais de Luciano, os planos geométricos de cor de Andrea ou a geometria sensível de Mariana, todos os trabalhos falam de uma imponderabilidade da forma plástica, esta sim, incompatível com a geometria.
Por isso, Forma é Afeto. Ao livrar-se dos limites da geometria estrita e ao abraçar a imprecisão do criar, estabelecem sentidos específicos para os seus trabalhos, distanciando-se das noções prontas sobre a abstração geométrica e lançando-se no terreno da descoberta, do tempo. Fica, portanto, o convite para nos aproximarmos dessas formas imponderáveis, deixar que elas se comuniquem conosco, contando o quanto de afeto trazem para nós.